sexta-feira, 5 de outubro de 2007

GRANDE ENTREVISTA DE CAVACO SILVA A KATIA REBARBADO D'ABREU - "Que Futuro?..."

K.R.A. – Professor, apesar de se apresentar como um candidato supra-partidário, continua a ser um Sá-Carneirista convicto…

C.S. – Sim, minha senhora, e, agora... que passa mais um malogrado aniversário sobre o seu desaparecimento, do fundo do meu coração, cada vez mais me sinto um Sá-Carneirista convicto...

K.R.A. –Tem consciência, no entanto, de que no período em que dirigiu o P.S.D., foi inúmeras vezes criticado por ter tentado destruir a espinha dorsal do partido desse fundador, afastando-se da ideologia inicial, e, sobretudo, deixando infiltrar-se nele todo o tipo de carreiristas provenientes das mais diversas fontes, sobretudo ex-maoistas, dos quais salientaria, pela negativa, Durão Barroso, Pacheco Pereira, ou, mesmo Zita Seabra...

C.S. – Minha senhora, em todos os períodos de crescimento…

K.R.A. – Sim, Professor, todos o períodos de crescimento são iguais, mas eu atrever-me-ia a dizer-lhe que há uns mais iguais do que outros. Todavia, e repegando na sua afirmação, enquanto Sá-carneirista, continua a acreditar em "Uma Maioria, um Governo, um Presidente"?

C.S. – Do mais fundo do meu coração, minha senhora…

K.R.A. – No entanto, se, como pensa, for eleito, em Janeiro, o Professor terá uma Presidência, mas uma maioria e um governo, em nada coincidentes consigo…

C.S. – Deixe-me discordar do que disse… Deixe-me dizer-lhe que o Eng. Sócrates…

K.R.A. – … que o Eng. Sócrates se atreveu a fazer em 7 ou 8 meses tudo aquilo que nem o próprio Professor conseguiu, nos seus 10 anos de maiorias absolutas…

C.S. – E é por isso que eu próprio tenho, repetidas vezes, afirmado que é muito cedo para julgar o Eng. Sócrates…

K.R.A. – Não estranha que o Povo Português, que se levantou contra si na Ponte, que permanentemente obstruía a sua governação, através das célebres "forças de bloqueio", subitamente se tenha deixado domesticar, e passado a aceitar, bastante passivamente, coisas e situações que teria liminarmente rejeitado, no período 1985-1995?...

C.S. – Isso só vem provar que eu tinha razão, e que já nessa altura não me enganava, e que Portugal poderia estar num outro caminho…

K.R.A. – Eventualmente, na cauda de todos os países entrados neste último alargamento. Deve estar lembrado de que a sua desatenção aos problemas sociais foi tal que o seu sucessor, o Eng. Guterres, teve de dizer que era chegada a altura de esquecer os números e começar a pensar nas pessoas…

C.S. – E a senhora acha bem o que ele fez, ao tentar alargar a base de distribuição de capitais por pessoas sem habilitações, muitas delas que nem sequer sabiam onde ficava Oxford, esbanjando, e provocando um desequlíbrio das Contas Públicas?…

K.R.A. – … o desequilíbrio das Contas Públicas era seu, Professor.., o maior "deficit" do período, apesar dos célebres 3 Orçamentos, o de Estado, o das Privatizações e o dos Fundos Estruturais. Mas vou-lhe perguntar directamente: por que pensa que os Portugueses estão a acatar tão pacificamente as medidas do Eng. Sócrates?...

C.S. – Sinceramente, penso que os Portugueses amadureceram, se habituaram à existência de uma Finança próspera, a que os salários devem ser tributados para ajudar, sempre que necessário, ao equilíbrio das contas públicas…

K.R.A. – A minha explicação é outra, Professor: os Portugueses estão calados, porque, nas expectativas que tiveram, durante o período crítico de 1985-1995, de se tornarem cidadãos europeus de pleno direito, viram, pelo contrário, desaparecer os Fundos Estruturais, diminuir o seu nível de Formação, aumentar desmesuradamente o Custo de Vida, sem consequente aumento de salários, e, em contrapartida, endividarem-se cada vez mais, para poderem ter algo que se assemelhasse ao Sonho Europeu que lhes estava a ser descaradamente roubado…

C.S. – Minha senhora…

K.R.A. – Pois é, Professor, os Portugueses estão calados porque estão crivados de dívidas, apavorados com darem um gesto em falso, e lhes cair imediatamente em cima a garra das penhoras do carro, da casa e de todos os bens que tiveram de adquirir artificialmente, através do recurso a cada vez mais prósperas e usurárias instituições financeiras. Depois de ter deixado as pessoas com habilitações básicas, de ter dado carta branca para a destruição da Agricultura, das Pescas, da Indústria, depois de ter tornado Portugal num mero quintal de bens importados, o que pensa o Professor fazer, caso seja eleito, para inverter esta tendência?...

C.S. – Minha senhora, a senhora está a ser injusta… Obviamente que Portugal precisa de uma dose de confiança que só a minha eleição lhe poderá dar, mas relembro-lhe que nos encontramos numa sólida situação das instituições financeiras privadas. Só nos primeiros meses deste ano…

K.R.A. – Portanto, o Professor não exclui a hipótese de lançar todos os Portugueses para o Sector Terciário?...

C.S. – Se isso for uma solução, por que não?...

K.R.A. – Ou seja, em última análise, de colocar metade da população defronte de monitores do Millennium-BCP ou do Banco Espírito Santo, a consultar o que a outra metade vai depositando do outro lado do balcão, trocando depois de posição, passando os do monitor para o balcão e os do balcão para o monitor, tudo isto em sistema fechado, e debaixo de um circuito de vídeo-vigilância?...

C.S. – E por que não, minha senhora?... Se vir bem, isso até seria uma matéria de ampla colaboração Presidente/Governo, ou, mesmo, uma abordagem inovadora do Choque Tecnológico!...

K.R.A. – Com os Portugueses já habituados à dureza das medidas de austeridade, não lhe poderia passar pela cabeça que, depois de eleito, e, portanto com dois desaires eleitorais seguidos, Autárquicas e Presidenciais, para a área da actual Maioria, considerar que estavam reunidas as tais "condições excepcionais" para uma dissolução da Assembleia, e convocação de eleições antecipadas, ou seja, submeter os Portugueses às mesmas medidas, mas lideradas por um Governo P.S.D., eventualmente encabeçado por Manuela Ferreira Leite?...

C.S. – Minha senhora, é muito cedo para me pedir que trace aqui esses cenários…

K.R.A. – ... que para alguém que acredita numa Maioria, num Governo e num Presidente, talvez não estivessem assim tão afastados…

C.S. – Minha senhora, cada coisa a seu tempo.

K.R.A. – O Professor confessa-se uma pessoa muito atenta às mudanças mundiais, sobretudo, ao problema da Globalização. Como quer devolver a confiança e melhorar o nível de vida dos Portugueses, sem o rio de ouro dos Fundos Comunitários, e com os Chineses, por exemplo, a produzirem 10 vezes mais e a ganharem 100 menos, para lançarem no mesmo patamar de, enfim… sucata, a que o Professor reduziu a Indústria Portuguesa, entre 1985-1995?...

C.S. – Ora ainda bem que me fala no exemplo Chinês: aí está o exemplo de onde uma nação confiante, com uma direcção forte e um modelo económico bem definido, pode atingir enormes níveis de produtividade a baixo custo…

K.R.A. – Está a falar do trabalho escravo e das contrafacções?...

C.S. – Obviamente que não, minha senhor, a Sociedade Neo-Liberal não é feita de escravos!... Basta… enfim... eu posso dar-lhe um exemplo… quando vou com a minha esposa, a Paris, tirar os modelos das roupas que se vão usar no ano seguinte, e que a costureira dela a ajuda a fazer, é usual ver muitas pessoas bem sucedidas, eu diria mesmo, milionários chineses, a fazerem as suas compras nas lojas mais caras de Paris, como qualquer cidadão ocidental!... A senhora não me vai dizer que os Campos Elísios estão cheios de escravos chineses!...

K.R.A. – Nem o Professor afirmar que são alguns milhares de chineses abastados que podem esconder a subsistência, em níveis mínimos, e com horários de trabalho inaceitáveis em qualquer sociedade pós-iluminista, de largas faixas de milhões de humanos, seus concidadãos…

C.S. – Minha senhora, numa sociedade de cariz liberal, nem todos poderão triunfar por igual, mas devemos dar-nos por satisfeitos de que haja muitos chineses a poderem ir a Milão, Paris, Londres ou Nova Iorque fazer as suas compras!... Os outros, eventualmente, não souberam aproveitar as oportunidades a que tiveram acesso. Posso mesmo adiantar-lhe que, se pudesse, gostaria de ter percentualmente, em Portugal, o mesmo número de milionários de que a China já dispõe…

K.R.A. – Posso assegurar-lhe, embora não disponha dos números exactos, de que poderá ter conseguido algo muito próximo desse objectivo, durante os seus dois mandatos governamentais…

C.S. – Ora aí está, vê como me dá razão, e de como o modelo chinês poderá ser um bom indicador para Portugal recuperar a Confiança, a Força de Vontade e os objectivos que agora lhe faltam!...

K.R.A. – É curioso como o Professor, um neo-liberal, se venha socorrer de um modelo pró-comunista, neo-reformado… aliás, há quem diga que o seu pragmatismo, duro, e de algum modo apolítico, terá muitas vezes levado a que muita da Direita mais radical se tenha revisto em si, ao mesmo tempo que conseguia fascinar uma Esquerda de teor Estalinista mal-disfarçado. Não nos podemos esquecer de que, durante duas maiorias absolutas consecutivas, conseguiu roubar votos, não só ao sector Democrata-Cristão, transformando o C.D.S. no célebre "Partido do Táxi", como também os roubou ao P.S. e mesmo ao ortodoxo P.C.!... 50% de votos não se conseguem, meramente recorrendo ao eleitorado de base social-democrata…

C.S. – E tenho muito orgulho desses feitos…

K.R.A. –… que foram obtidos em tempo de vacas gordas. Relembro ao Professor que só lhe foi permitido governar com conforto depois de o último Governo de Bloco Central, presidido pelo Dr. Mário Soares, ter, com o auxílio de Ernâni Lopes, equilibrar as Contas Públicas. Ou seja, o Professor apareceu, quando as condições eram favoráveis, e tornou-se célebre por desaparecer, sempre que a conjuntura não lhe era de feição, e basta relembrar o seu abandono do Governo da A.D., presidido por Pinto Balsemão – que nunca lho perdoou --, ou já no final da sua 2ª. Maioria Absoluta, quando entregou o Dr. Fernando Nogueira às feras, sabendo que se arriscava, como veio a acontecer, a perder…

C.S. – (silêncio)

K.R.A. – Os Portugueses não deverão temer, com a situação económica, financeira e social do país a degradar-se, de dia para dia, que o Professor, subitamente, e, mais uma vez, abandone o barco?...

C.S. – Minha senhora…

K.R.A. – Resumindo: já ficou aqui patente que o Eng. Sócrates encontrará em si um aliado para prosseguir políticas que não pouparão nada, nem ninguém, para dar o primado do equilíbrio das contas, em detrimento do bem-estar social…

C.S. – Minha senhora, na minha especialidade de Finanças Públicas…

K.R.A. – Já sabemos: na sua especialidade, uma conta certa vale um milhão de pedintes, e dois milhões de desempregados…

C.S. – Ó, minha senhora, por amor de deus…

K.R.A. – ... e que quando os Portugueses já estiverem suficientemente descalçados, endividados e garrotados, e o Eng. Sócrates se tornar num força de bloqueio, poderá abanar a situação partidária, de modo a voltar a chamar a sua área política de base para o Governo…

C.S. – (silêncio)

K.R.A. – Que culturalmente, apenas poderemos esperar de si o regresso de Lá Férias, Ritas Ferros e Vascos Graças Mouras…

C.S. – E de Katia Guerreiro, minha senhora…

K.R.A. –… sim, eventualmente a sua maior conquista pré-eleitoral: ter introduzido no imaginário português o KAPA, uma letra que não pertence ao nosso alfabeto…

C.S. – Também teremos, em 2006, o "Rock in Rio"…

K.R.A. – … mais uma vez, patrocinado pela Opus Dei, que , aliás, tinha uma gigantesca árvore de Natal plantada, o ano transacto, em Belém, e que, este ano, já a conseguiu pôr a desfigurar a excelente Praça do Comércio, e que pelo avançar dessa Seita no nosso quotidiano, para o próximo ano, deverá ter uma árvore de Natal prantada no alto do Castelo de São Jorge!...

C.S. – Minha senhora, por amor de deus…

K.R.A. – O Professor tem consciência de que, apesar de tudo se lhe apresentar como favas contadas, ainda agora a procissão vai no adro?... Lembra-se do que sucedeu em 1986, com a 2ª Volta das Eleições Presidenciais, em que Freitas do Amaral, "QUASE" eleito à 1ª., foi derrotado pelo candidato Mário Soares, que partia em visível desvantagem, e com um desgaste governamental fortíssimo?...

C.S. – O Professor Freitas do Amaral, que tive muito gosto em apoiar…

K.R.A. – … enquanto parecia ir ganhar, e cujas dívidas de campanha deixou de ajudar a pagar, mal ele perdeu… O Professor Freitas do Amaral… O Professor Cavaco Silva não tem medo, por exemplo, do impacto que venha a ter no espectro eleitoral português uma pública declaração de apoio do Professor Freitas do Amaral à candidatura de Mário Soares?... Não poderá começar aí o fim da sua… enfim… euforia pré-presidencial?...

C.S. – (silêncio)

K.R.A. – Professor, esta nossa entrevista já vai longa, a partir de hoje, o Professor irá ter oportunidade de discutir estas e outras ideias, nos sucessivos debates televisivos, em que irá participar, mas antes de nos despedirmos, gostaria de lhe pôr uma última questão: uma coisa que muito intriga os seus vizinhos, e escandaliza, mesmo, as senhoras suas vizinhas da Lapa, é por que é que o Professor, sempre que se desloca à "Pastelaria Carrossel", em de vez de fazer o que qualquer avô normal faria, só dá meio queque ao seu netinho?…

C.S. – (sorri) Minha senhora, é para que, quando ele encontrar a Maria da vida dele, lhe possa estender a outra metade, e dizer: "Toma, Maria, esta metade estava guardada para ti…"

FIM

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